Psicose
A psicose é uma forma de organização psíquica caracterizada pela perda parcial ou total do contato com a realidade. Nessa estrutura, o sujeito apresenta alterações profundas na percepção, no pensamento e na afetividade, manifestando delírios, alucinações e interpretações distorcidas do mundo externo. Diferente da neurose, em que o conflito ocorre entre o desejo e a repressão, na psicose há uma falha na constituição simbólica do sujeito, o que compromete sua relação com o outro e com a realidade compartilhada.
Na perspectiva psicanalítica, especialmente a partir das formulações de Sigmund Freud e Jacques Lacan, a psicose não é entendida como uma simples “doença mental”, mas como uma estrutura psíquica que se forma a partir da maneira como o sujeito se inscreve na linguagem, na lei e na cultura. Freud definiu a psicose como uma ruptura do “eu” com a realidade, substituída por uma nova construção imaginária — o delírio —, que tenta restabelecer o equilíbrio psíquico perdido.
Lacan, por sua vez, introduziu o conceito de forclusão do Nome-do-Pai, para explicar o mecanismo central da psicose. A forclusão significa a exclusão de um significante fundamental — a lei simbólica que regula o desejo e o pertencimento à ordem social. Quando essa lei não é simbolizada, o sujeito fica sem um ponto de referência estável que organize seu mundo interno. Por isso, em momentos de crise, o real invade o campo psíquico de forma bruta, dando origem às alucinações e delírios, que funcionam como tentativas de reconstruir o laço com a realidade.
Do ponto de vista clínico, a psicose se manifesta de maneiras diversas, dependendo da estrutura subjetiva e do contexto de vida de cada pessoa. Entre os quadros mais conhecidos estão a esquizofrenia, marcada por desorganização do pensamento e isolamento afetivo; a paranoia, caracterizada por ideias de perseguição e interpretações rígidas da realidade; e a melancolia, que pode se apresentar com sentimentos intensos de culpa e autodepreciação.
É importante ressaltar que, embora a psicose possa gerar grande sofrimento, ela não deve ser reduzida a um rótulo ou a uma incapacidade. Muitos sujeitos psicóticos possuem formas singulares de expressão e criação simbólica, que lhes permitem estabelecer vínculos e construir sentidos próprios. A escuta clínica, nesse sentido, deve acolher o discurso do sujeito sem julgamentos, reconhecendo o valor subjetivo de suas construções.
O tratamento da psicose envolve uma abordagem multidisciplinar, combinando o acompanhamento médico, psicológico e, quando necessário, o uso de medicação. Na psicanálise, busca-se favorecer um espaço de escuta que permita ao sujeito organizar sua experiência simbólica e reconstruir um modo singular de estar no mundo. O objetivo não é eliminar o delírio ou a alucinação, mas ajudar o sujeito a dar um sentido ao seu sofrimento e encontrar formas possíveis de convivência com a realidade.
Em síntese, a psicose é uma estrutura complexa que revela os limites e as potências do funcionamento psíquico humano. Ela nos mostra que o contato com a realidade não é algo dado, mas construído simbolicamente, e que cada sujeito encontra suas próprias formas de habitar o mundo. Compreender a psicose, portanto, é compreender também a diversidade e a profundidade da experiência humana.
